20 June 2010
Domingo, 20 de junho de 2010 - 08:05
Financiamentos e programas sociais são fórmulas para comunidades carentes terem ascensão financeira
patricia.basilio@diariosp.com.br
Famílias que antes viviam em favelas e não tinham sequer um endereço para apresentar ao vendedor na hora de comprar no carnê hoje fazem parte da nova classe C e têm casa mobiliada, computador, notebook, TV de plasma e carro novo. Tudo em suaves prestações. Além disso, com o Programa de Urbanização de Favelas, da Prefeitura de São Paulo, 70 mil famílias deixaram os barracos para viver em apartamentos com rede elétrica, encanamento e espaço de lazer.
Um exemplo dessa nova geração de consumidores é o segurança João Pedro dos Santos Filho, de 30 anos. Natural de Alagoas, ele mora há oito anos na favela de Paraisópolis — localizada na Zona Sul de São Paulo e com cerca de 100 mil habitantes — com sua mulher e filho de 1 ano, porém, há oito meses pode dizer que realmente possui um lar para a família. Após conseguir um apartamento pelo programa da Prefeitura, longe da zona de risco, ele decidiu apostar no crediário e comprar móveis e eletrodomésticos novos. “Quando vim de Alagoas, não tinha nada. Estou na melhor fase da minha vida.”
O segurança morava em uma casa simples com apenas um quarto. A falta de espaço para criar o filho, Pedro Henrique, e receber colegas começou a incomodar a família. “Agora ele tem lugar para brincar e eu não tenho mais vergonha de chamar os amigos para a minha casa.” Mãe solteira, a recepcionista de caixa Iranilda Oliveira, de 25, veio de Salvador há quatro anos em busca de uma melhor qualidade de vida para a sua filha Emily, hoje com 6. Sem condições de comprar uma moradia segura, ela adquiriu uma casa localizada em cima de um esgoto na favela de Paraisópolis. Por conta do risco de desabamento, há dois anos, ela recebeu um apartamento da Prefeitura. “A casa antiga tinha só um quarto e não possuía estrutura de fiação elétrica, nem encanamento.”
A empolgação com o apartamento novo fez com a que Iranilda investisse pesado em móveis e eletrodomésticos. “Quando vim para cá, decidi comprar uma mesa, cadeiras bonitas e uma máquina de lavar roupas nova. Parcelei as compras para pagar aos poucos e, com o tempo, pretendo decorar ainda mais a minha casa”, diz.
De acordo com Elizabeth França, superintendente de habitação popular da Secretaria de Habitação de São Paulo, o fácil acesso ao crédito foi o grande alicerce do programa de urbanização. “Com os financiamentos, os moradores têm condições de mobiliar a casa e vice-versa. É uma via de mão dupla.”
Para Gilson Rodrigues, presidente da União dos Moradores de Paraisópolis, com a urbanização, as pessoas sentem mais orgulho de morar na favela, buscar emprego e consumir mais. De olho nisso, há dois anos, a Casas Bahia abriu uma unidade em Paraisópolis com financiamentos mais acessíveis. “As grandes empresas estão pensando bem nesse público consumidor e vindo para cá, como bancos, redes de fast-food e até agências de viagem”, conta.
Para Maria Helena de Souza, de 49 anos, um apartamento novo não significa apenas uma moradia mais segura e aconchegante, mas também uma nova oportunidade profissional para toda a sua família.Moradora da favela de Jaguaré — Zona Oeste da capital com cerca de 12.500 habitantes — ela morava em um barraco de madeira, sujeito a alagamentos, sujeira e perda de todos os móveis e eletrodomésticos comprados. Há três semanas, recebeu um apartamento da Prefeitura para recomeçar a vida. Natural de Salvador, ela veio a São Paulo há dez anos em busca de um emprego com maior remuneração para criar suas duas filhas Marciana e Marcilene, hoje com 21 e 16 anos, respectivamente. “A gente não recebia cartas no barraco e ainda tinha que colocar o endereço de amigas no currículo”, comenta. Segundo Maria Helena, a maior alegria da família está em poder começar uma vida nova com seus três netos e não ter risco de perder todos os móveis com os alagamentos. “A primeira coisa que vamos fazer é ir atrás de emprego para melhorar a nossa vida”, conta ela.
Criado oficialmente em 2005, o Programa de Urbanização de Favelas da Secretaria Municipal de Habitação (Sehab) objetiva reformar ou retirar moradores de áreas de risco. Segundo a secretaria, 70 mil famílias foram removidas de barracos em zonas perigosas ou tiveram suas casas reformadas. Até o momento, já foram entregues oito mil apartamentos novos de 52 metros quadrados, com dois quatros, sala, cozinha, banheiro e lavandeira. Um investimento de R$ 3 bilhões. A meta é beneficiar 150 mil famílias até 2012.
O sucesso do programa garantiu à Prefeitura o prêmio “Prix d’Excellence Awards 2010” categoria “Infraestrutura Pública”, concedido no início do mês pela Fiabci, federação imobiliária internacional, ligada à ONU.
O mercado e a padaria de Valmir de Souza, de 48 anos, viu sua clientela triplicar após a reforma feita pela Prefeitura. “Agora recebo fornecedores, tenho mais espaço e até sistema para máquina de cartão de crédito”, comemora.